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Para Encher Todas As Coisas

por T. Austin-Sparks

Capítulo 2 – Esvaziamento para Plenitude

Leitura: “Aquele que desceu é também o mesmo que subiu acima de todos os céus, para encher todas as coisas”. (Efésios 4:10)

Buscamos ver, nessa última declaração desse servo do Senhor, a poderosa plenitude de sua apreensão de Cristo. Tentamos adentrar na tremenda emoção com a qual o apóstolo se colocou para escrever essa carta circular. Tendo finalmente a oportunidade de estar livre de todas as viagens, jornadas e ocupações com os assuntos das igrejas, sendo agora separado e trancado em sua prisão, ele descobriu a oportunidade que seu coração havia a muito desejado expressar, até onde fosse possível, um pouco desse poderoso estoque de conhecimento espiritual acumulado a respeito do Senhor Jesus. Então, essa carta é a abertura dessas comportas, um derramar de superlativos, esgotando todas as possibilidades na limitação da língua, para encontrar alguma forma de expressar o Cristo que havia sido revelado a ele.

Este poderoso fragmento contém um resumo de tudo isso, uma visão final desse Senhor maravilhoso: “para [Ele] encher todas as coisas” – o Senhor Jesus finalmente enchendo todas as coisas.

Temos visto que esse grande “Ele”, a quem o apóstolo se refere, é o objeto de toda a Bíblia. Seguimos o rastro desse mistério nos seus sete grandes estágios, desde a eternidade passada, através do tempo, das eras, e em cada estágio, o apóstolo vê profundeza de significado.

Agora, partimos dessa vasta área, desse vasto escopo, e buscamos reduzir em uma ou duas ênfases particulares enquanto prosseguimos.

Primeiramente, esta frase, por si só, claramente indica a grandeza do Senhor Jesus: “para [Ele] encher todas as coisas”. A consumação final de “todas as coisas”. É impossível estar fora disso! Isso é conclusivo: não há nada mais que possa ser adicionado. “Todas as coisas” simplesmente significa “tudo”. Esses eternos e divinos propósito e determinação, que foram revelados ao apóstolo, é que Cristo encha todas as coisas. Esse é o conselho predeterminado de Deus. Deus “estabeleceu um dia em que há de julgar o mundo com justiça, por meio de um varão que destinou” (At 17:31). Esse é o Senhor Jesus. Essa frase é um indicativo da grandeza de Cristo.
Como pode uma Pessoa encher o universo, encher todas as coisas? Bem, essa não é uma questão difícil de responder. Em parte desse mundo, em toda a sua extensão e largura, encontramos as pegadas do maligno. Por onde quer que você vá, encontrará algo que indica e denuncia que o maligno esteve ali. A maldade do maligno enche esse mundo, em qualquer lugar, em todo lugar. Podemos até dizer, em sua condição natural, ele, o maligno, o diabo encheu todas as coisas. Apesar de não o vermos na forma pessoal, sabemos que ele esteve ali, e frequentemente sabemos que ele está lá. Ele encheu esse mundo com sua natureza, marcas e características malignas. Elas estão em todos os lugares. Indiscutivelmente, ele encheu a atmosfera consigo mesmo. O encontramos em todo o lugar, em toda a criação que foi tomada de Adão. Nós o encontramos em sua natureza, em sua disposição, em sua atmosfera e presença maligna.

Exatamente da mesma forma, Cristo encherá todas as coisas. A maldade será purgada pelo fogo eterno. Será completamente removida. Nenhuma marca dela será deixada ou encontrada quando Deus tiver terminado Sua obra nessa criação. Também não haverá espaço desocupado. Seu Cristo é quem está destinado a encher todas as coisas. Em qualquer parte de Seu universo criado, poderemos conhecê-Lo pelas Suas pegadas, senti-Lo, notar Sua presença, reconhece-Lo. Que atmosfera diferente!

No presente tempo em que vivemos, ainda que servindo de forma deficiente a esse propósito, encontramos apenas um pequeno reflexo do que de fato será. É uma grande bênção estar onde Cristo está. É uma maravilhosa atmosfera estar presente quando Ele também está e quando Ele está enchendo todos os corações. Há um comportamento, uma conduta e uma disposição que é tão diferente quando Ele tem Seu lugar na companhia de vidas. Não temos muito hoje do que chamamos de “céu na terra”. Sempre há muito espaço para mais do que isso! Mas nós aqui sabemos um pouco, muito pouco do que é isso. O inimigo ainda está presente e prestes a estragar, a arruinar tudo, mas se o Senhor possui pessoas em quem Ele de fato tem Seu senhorio expresso, um lugar dado totalmente a Ele, esse é um lugar muito abençoado de estar e uma condição para se regozijar. Existe muito pouco disso nesse mundo. Poderia haver mais!

É claro que o que estou dizendo nos levará a algo mais, mas aqui está um indicativo do que o Senhor pretende, e alguém pode dizer: queridos amigos, vocês verão que não gostamos muito de viver em abstrações e em coisas de visionários, palavras, lindas ideias e esse tipo de coisas da esfera da imaginação. Sempre temos que ter um terreno prático para construir essas grandes concepções. Então, quando falamos sobre um tempo em que Ele encherá todas as coisas consigo mesmo, nesta forma de caráter, de natureza, de disposição, de conduta e de comportamento, precisamos ter algo sobre o qual podemos firmar nossos pés no presente. E este algo é o grande deleite que os corações cristãos encontram quando estão naquele tipo de comunhão e relacionamento onde Cristo é tudo. E isto é real. É possível conhecer agora, não é? Sim, é possível!

Mas isso tudo é muito pouco. Não significa nada se compararmos com “todas as coisas”. Este é o conselho determinante de Deus e assim será, que Ele, o amado Filho, encherá todas as coisas consigo mesmo, Seu próprio maravilhoso caráter, Seu divino caráter.

Aqui está algo que talvez possa parecer difícil de absorver e entender, mas observe o contexto dessa frase: “que quer dizer subiu, senão que também havia descido até às regiões inferiores da terra? Aquele que desceu é também o mesmo que subiu acima de todos os céus”. Não teria sido necessário haver encarnação se Deus quisesse encher todas as coisas com Deus, como deidade. Deus poderia muito bem esvaziar tudo e simplesmente encher consigo mesmo na perfeita deidade, em absoluta divindade. Mas essa expressão “Ele desceu... ascendeu... para [Ele] encher todas as coisas” indica isso: a encarnação. Como Ele desceu? Bem, nós sabemos. Pela encarnação Ele veio em carne, em humanidade – “assumindo a forma de servo... reconhecido em figura humana, a si mesmo se humilhou” (Filipenses 2:7-8). Esta foi Sua descida – para dentro da humanidade, na encarnação. Por que? “para [Ele] encher todas as coisas” – em outras palavras, ter pessoas em quem e através de quem Ele encheria todas as coisas; ter uma raça humana através de quem Ele encherá todas as coisas, que ministrará e transmitirá Sua plenitude.

Agora, um dos grandes argumentos dessa carta: “A igreja, a qual é o seu corpo, a plenitude daquele que a tudo enche em todas as coisas” (Efésios 1:23). Isso quer dizer que o Senhor deveria ter pessoas, seres humanos, para expressão de Sua plenitude no Seu universo criado: você e eu. É por isso que Ele primeiro descendeu e depois ascendeu – para que Ele pudesse encher todas as coisas.

Esse grande círculo de descida profunda até tocar o coração, raiz e núcleo de todos os problemas, para abaixo das profundezas, e depois Sua ascensão acima de tudo, foi para não haver nenhum resquício de domínio onde Ele não seja a plenitude. Ele fez isso através da encarnação, o que significa que, por meio da vida humana, houvesse uma vida humana como essa.

Essa é a grandeza Desse que é capaz de fazer tudo isso. Ele deve ser muito grandioso!

Isso nos leva à lei que governa toda a história e experiência espiritual. Não é algo que está simplesmente acontecendo em nós pelo próprio livre-arbítrio, mas é debaixo dessa lei; é controlado e governado. A experiência espiritual que estamos tendo, a nossa história que está sendo desenvolvida, espiritualmente, é mantida por esta lei, que é: “para [Ele] encher todas as coisas”. Se esta é a questão para os homens, para as pessoas, para a humanidade, para a vida humana, então deve haver algo nisso, atrás e sobre o que acontece conosco quando chegamos às mãos de Deus. E isto é: Deus está nos tomando da forma que está com esse único objetivo em vista – que Seu Filho, Jesus Cristo, encha todas as coisas.

No entanto, infelizmente Ele não pode começar do zero conosco. Já estamos tão cheios! Tão cheios de nossas próprias ideias, nossos próprios desejos, nossas próprias ambições, nossos próprios interesses e nossa própria força. Oh, estamos tão cheios de tantas coisas! E esse problema existe desde Adão, que fez essa grande proposta de ter toda a plenitude em si mesmo. O Senhor permitiu que Adão decidisse por isso e então, Adão se tornou mais do que uma pessoa que viveu há muitos séculos. Adão é muito grande, uma pessoa corporativa, que encheu o mundo e ainda está fazendo esta proposta de ter todas as coisas em si mesmo. Ele é muito cheio de si mesmo. Ele é muito cheio de sua própria esperteza, habilidades, força, sabedoria e tudo mais. Ele está enchendo a si mesmo cada vez mais com sua própria plenitude.

Esse é o estado desse grande Adão; mas, e os pequenos Adãos que somos nós? Você e eu? Não sabemos e não acreditaríamos até que a mão do Senhor venha até nós, e então começamos a descobrir que existe muito de nós em cena. Quando o Senhor começa a trabalhar em nós, descobrimos que existe muito mais de nós do que poderíamos saber ou suspeitar: na verdade, isso é uma questão sem fim, um poço sem fundo. Todo o problema reside no fato de que existe algo em nós que precisa ser afastado e tirado do caminho. Não é verdade? Todos os nossos problemas com o Senhor, dos mais simples aos maiores e mais complexos, estão nessa base. Então, se Ele encherá todas as coisas consigo mesmo, deve haver uma história, uma profunda história de abrir um completo espaço para Ele, através de um total esvaziamento de nós mesmos, de tudo que não é Cristo.

Isso não é algo negativo, apesar de às vezes parecer – esvaziamento, perda, quebrantamento e tudo mais - essa lei está operando. Essa é a lei em sua natureza. Deus pôs cada árvore do jardim nas mãos de Adão. Elas foram cultivadas e não era necessário o mal estar presente para que a faca de poda fosse usada. Esse era o processo natural. Para produzir algo melhor, é necessário livrar-se das coisas que não são tão boas. Para produzir algo a mais, é necessário reduzir o que achamos ser grandes coisas. Esta é a lei em sua natureza – vemos isso em todo o lugar. Naquilo que é melhor, que é mais, sempre há um processo de destruição. Isso é edificação, fecundidade. Essa lei opera em todo lugar. A experiência espiritual está debaixo dessa lei porque foi Deus quem a estabeleceu na criação. Deus está trabalhando, queridos amigos, com você e comigo. De um lado esvaziando, quebrando, cortando, dando a impressão de estar reduzindo, nos esvaziando de qualquer outro tipo de plenitude que está em Seu caminho e que não é a Sua plenitude, mas sempre com o mesmo objetivo – para que haja mais de Cristo.

Talvez alguns de vocês possam dizer “bem, deve haver muita coisa de Cristo em mim, se isso é a explicação, porque estou passando por um tempo muito difícil!”. Mas, aqui é onde a fé e a paciência são demandadas, e devemos considerar a lei invariável de que qualquer tipo de obra da parte de Deus que produz um efeito de esvaziamento, de desconstrução e enfraquecimento daquilo que diz respeito à vida do ego, é determinado por Deus para produzir mais de Seu Filho. Essa é a lei eterna e que está governando.

Podemos notar que a Bíblia é um registro dessa lei. Vemos que Adão deixou entrar todo o problema da plenitude do ego, o que foi uma maldição para a humanidade, e será o que a levará a sua total ruina. Não se engane a respeito disso! A astúcia do homem pode ser sua ruína. Aquilo que o homem chama de aumento da sabedoria e conhecimento pode voltar contra si mesmo. Adão abriu essa porta e deixou entrar essa maldita autossuficiência.

Você descobrirá que Deus sempre está agindo em relação ao Seu alvo, Seu alvo eterno. Ele põe Suas mãos sobre qualquer homem ou qualquer instrumento, para usá-lo através da história, pelo tempo que for necessário para completar o processo de desconstrução. Quem vem a nossa mente? Bem, vamos começar com Abraão.

Temos toda evidência de que Abraão, ou Abrão, era um grande homem na Caldéia, um homem com considerável substância, constância, possessões e suficiência. Estevão nos fala que “o Deus da glória apareceu a Abraão, nosso pai” (Atos 7:2) – e como o Deus da glória começou Sua obra? Bem, Ele simplesmente tirou Abraão da Caldéia e o trouxe a um lugar onde toda sua outrora autossuficiência e plenitude foram gradualmente removidas. Ele não deu a Abraão nenhuma estabilidade naquele lugar. Tudo o que ele tinha era uma tenda – movendo-se de lugar para lugar. Nenhuma “cidade permanente”; uma vida de total dependência de Deus. Ele estava sendo esvaziado. Perceba os vários estágios de tratamento de Deus com ele, a ponto de requerer que ele oferecesse seu Isaque. Alguma vez um homem chegou tão perto do grande coração do Calvário, em total esvaziamento de si mesmo, ao ponto de entregar aquilo que para ele era seu tudo e seu último, seu Isaque? Esse homem estava sendo esvaziado! Mas Deus apareceu a ele e disse: “multiplicarei a tua descendência como as estrelas dos céus e como a areia na praia do mar” (Gênesis 22:17). Esvaziamento – para a vasta plenitude. Essa é uma história espiritual. Não se trata de mero ensino. Pergunte a Abraão se isso é real!

Jacó: Jacó foi eleito, destinado a edificar as tribos de Israel através de seus doze filhos. A plenitude viria dessa forma, tremenda plenitude. Essa semente de Abraão deveria vir através desse homem Jacó. Mas Jacó era um homem muito autossuficiente, cheio de esperteza e astúcia. Ele se sentia capaz de cumprir essa obra, achava que tinha tudo o que era necessário. Pelos vinte anos que viveu com seu tio Labão, que tinha o seu mesmo estilo de vida, enganando e triunfando através de sua engenhosidade, esperteza e astúcia, sempre tirando vantagem para si mesmo, simplesmente porque ele era capaz disso. Muito bem – mas o que dizer de Jacó e Peniel? O Senhor, em uma dessas teofanias de que estávamos falando nesta tarde, encontrou com ele e disse: “Agora, vamos resolver esta questão de uma vez por todas. Eu te permiti ir muito longe, Eu te dei todos esses anos para você se auto expandir, mas Eu te escolhi para algo melhor do que isso. Chegou o momento. Esta noite resolveremos isso”. Jacó começou novamente a testar o Senhor, e descobriu que tinha encontrado seu páreo, e mais do que seu páreo naquela noite. Essa história nos é contada de forma errada muitas vezes: Jacó lutou com o anjo. Ele não fez isso antes do anjo lutar com ele primeiro: “lutava com ele um homem” (Gênesis 32:24). Deus tomou a iniciativa nessa questão. Deus tomou as rédeas da situação em Suas próprias mãos. Foi Deus quem disse: “Nós vamos resolver essa poderosa questão. Antes de você voltar para aquele lugar de aliança, de propósito, nós vamos definir as coisas”. Quem é o mestre, Jacó ou o Senhor? Oh, que esvaziamento aquela noite! Não tudo de uma vez, talvez, porque havia ainda alguns traços de Jacó depois desse incidente, mas quando o encontramos na presença de Faraó, que pobre criatura ele era! Ele falou à Faraó – “poucos e maus foram os dias dos anos da minha vida” (Gênesis 47:9). Apoiando-se em seu bordão – ali ele era um homem muito vazio, um homem muito quebrantado. Agora o Senhor pode fazer algo: através daquilo, o propósito de Deus poderia ser realizado.

E José? De muitas maneiras, um bom e agradável jovem camarada, o predileto de seu pai e muito mais, mas... mas... muito pretensioso! Muito indiscreto! Falar para seus irmãos a respeito de seu sonho e insinuar “vocês serão aqueles que se curvarão para mim”, provocou uma situação que se tornou a oportunidade soberana de Deus de começar uma obra de esvaziamento. Um calabouço não é o melhor lugar para se viver por treze anos! Estar esquecido e suportando todas as privações e dificuldades de uma vida como aquela. Por isso está escrito: “ferros transpassaram sua alma” (Salmos 105:18 VR margem). É possível obter alguma coisa sobre ferros transpassando sua alma debaixo da disciplina da mão de Deus? Bem, não precisamos nos delongar. Aqui está este homem sendo esvaziado de todos seus conceitos, mas que finalmente, que plenitude! Plenitude para o Egito, para seus próprios irmãos e para os demais. Esse é o caminho.

Chegamos a Moisés. Moisés havia sido ensinado na sabedoria dos egípcios. Que homem foi Moisés nos seus primeiros quarenta anos de vida! Tão cheio de tantas coisas! Tão cheio, a ponto de pensar que poderia fazer tudo. Ele feriu o egípcio, desafiou o hebreu – ele achava que podia fazer qualquer coisa. Ele estava muito cheio. Quarenta anos no deserto foi um tempo bem calculado para esvaziá-lo desse tipo de coisa! Não é de se surpreender que no final de oitenta anos ele tenha dito: “Eu não posso. Eu não sou capaz”. “Muito bem”, disse o Senhor, “então venha, que eu te enviarei”. A mesma história – que esvaziamento para a plenitude!

Não ousamos permanecer em Israel como nação. Com as mãos do Senhor sobre Israel, passamos para Davi. Uma coisa é certa a respeito do lidar do Senhor com Davi – o operar dessa lei de esvaziamento, humilhação, a ponto de torná-lo plenamente dependente a fim de trazê-lo para os lugares mais altos da plenitude de Israel no Velho Testamento. Assim continua pela história.

Essas ilustrações mostram que o Senhor está operando através dessa lei. Ele está operando em direção a esse fim – “para [Ele] encher todas as coisas”, mas para isso, como precisamos ser esvaziados! Que obra de esvaziamento Ele precisa fazer! Não existe nada que atrapalha o caminho do Senhor mais do que a autossuficiência. Essa é apenas outra forma de falar “orgulho”. Isso atrapalha o caminho do Senhor, e quando Ele termina sua obra conosco, não existe mais espaço para qualquer tipo de orgulho. No que diz respeito a nós, o caminho é para baixo. Mas, Oh! Olhe para o fim, o divino final! O acréscimo de Cristo – “para [Ele] encher todas as coisas”.

O processo de reversão da nossa própria plenitude para a Sua plenitude depende de haver uma crise. Assim como o Senhor encontrou Jacó naquela noite, assim como o Senhor encontrou Moisés numa crise, ou como encontrou Saulo de Tarso numa verdadeira e real crise, deve haver um momento e um lugar aonde você e eu cheguemos diante do Senhor nessa questão de vida do ego e de vida de Cristo, e então dizemos: “Está resolvido. No que se refere à posição, à aceitação e os fundamentos, tudo está estabelecido. Deus me ajude, de uma vez por todas. Que em todas as coisas seja ‘não mais eu, mas Cristo’ (Gálatas 2:20). Que seja: ‘Para mim o viver é Cristo’ (Filipenses 1:21)”. Isso é crise. Ela não resolve tudo, mas a posição é garantida, a base é estabelecida e assim deve acontecer.

Não tenho dúvidas de que muitos de vocês conhecem o que estou falando. Sabemos que houve um momento, mais ou menos longo – pode ter sido um dia, uma noite, ou mesmo um período – mas foi um momento em nossas vidas em que surgiu uma crise com relação à vida do ego contrapondo à vida de Cristo, e deve ter sido dessa forma que estamos falando. O processo começa a partir de uma crise, a vida Cristã debaixo das mãos do Senhor passa exatamente por esse caminho – cada vez mais profundo. Se assim for, então, ânimo! Permita-nos provar e receber todo o consolo que isso nos traz. O esvaziamento de nós mesmos se torna cada vez mais profundo, a fim de trazer a grande plenitude de Cristo em nós. Esse é um processo que está acontecendo. E, me parece que isso acontece tanto através da Palavra como da experiência, até que no final não sobre muito de nós! Se o Senhor não for tudo, que Deus nos ajude! Este é o fim destinado para nós. Será somente o Senhor ou nada. Ele está trabalhando desta forma, e quando Ele trabalha através desse processo, é porque Sua intenção é que seja de acordo com Seu conselho predeterminado de “[Ele] encher todas as coisas”.

Uma crise, um processo, mas, bendito seja Deus! Um clímax. A Palavra se revela nesta epístola. Aquele dia, aquele glorioso dia do clímax, quando será “glória na igreja... para todo o sempre” (Efésios 3:21).

Se o que falamos é verdade, existe então algo mais que devemos meditar a respeito, que é: a medida atual determinará a medida daqui para frente. O que o Senhor está fazendo conosco não é apenas algo arbitrário. O Senhor está criando espaço para as coisas espirituais. Toda a plenitude do que é espiritual está à frente, daqui em diante, pelas gerações. O espaço dentro de nós em que esta plenitude poderá se expressar será na proporção da medida que o Senhor teve permissão de desenvolver em nós agora. Sabemos que isso é importante. Não terei como entender o Novo Testamento; será um enigma perfeito se o que estou dizendo agora não for verdade. Para que tudo isso no Novo Testamento se, quer queira quer não, seremos trazidos para toda a plenitude? Se o agora não importa, se atingiremos esse objetivo apenas por pertencer ao Senhor, se alcançaremos esse propósito por sermos do Senhor, por que tudo isso a respeito de “o Senhor corrige a quem ama” (Hebreus 12:6), e toda essa disciplina e sofrimento? Você pode perceber toda a situação que se levanta? Certamente isso fala mais poderosamente – o espaço, a medida, a proporção em que o Senhor alcança seu objetivo conosco agora determinará nossa medida na gloria.

Nenhum de nós, que conhece algo a respeito da dificuldade e sofrimento da vida cristã, falha em ver que o Senhor está buscando nos alargar através de meios dolorosos. Começamos com pouca capacidade espiritual para ter, receber, conhecer e entender as coisas espirituais. Então o Senhor começa seu trabalho sobre nós – e esse trabalho de alargamento é terrivelmente difícil! O salmista disse: “Na pressão Tu tens me alargado” (Salmos 4:1 – tradução livre versão Darby). Pressão para alargamento é algo doloroso, não é? Mas o Senhor está trabalhando para aumentar nossa capacidade. Graças a Deus que isso é verdade! Apesar de sermos tão imperfeitos: sentimos que não progredimos muito. Entretanto, alguns de nós podemos ver hoje, podemos entender, podemos conhecer de uma forma inteligente o que um dia foi algo tão distante de nós, fora do nosso alcance. Estamos aprendendo, estamos crescendo em entendimento, estamos nos tornando mais e mais capazes de receber as coisas de Deus.

Essa é a vida cristã normal. Isso é o que o Senhor está fazendo conosco. Essa lei, de Cristo enchendo totalmente todas as coisas, está governando nossa história espiritual e nossa experiência espiritual diária. O que então cabe a nós fazer? Bem, devemos aplicar nossos corações rápida e definitivamente a aprender as lições do nosso sofrimento, a aprender o significado das nossas adversidades e provações, a descobrir onde mais Cristo deve entrar através desse quebrantamento do nosso ego. Isso é cooperação com Deus em Seu objetivo final. Ele desceu, veio aqui para baixo, para nos tomar em nossa humanidade, e subiu acima de todos os céus – e ambas as coisas são governadas por essa declaração intencional: “para [Ele] encher todas as coisas”.

Em consonância com o desejo de T. Austin-Sparks de que aquilo que foi recebido de graça seja dado de graça, seus escritos não possuem copirraite. Portanto, você está livre para usá-los como desejar. Contudo, nós solicitamos que, se você desejar compartilhar escritos deste site com outros, por favor ofereça-os livremente - livres de mudanças, livres de custos e livres de direitos autorais.