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Plenitude

por T. Austin-Sparks

Editado e suprido por Golden Candlestick Trust. Origem: "Fulness". (Traduzido por Maria P. Ewald)

Leitura: Salmo 24, Gênesis 25:24-34

Ao lermos o Salmo 24, a palavra que logo se destaca é plenitude. Somos então confrontados com algo que é grandioso demais para o homem alcançar, que se estende além de toda a concepção humana e que fala de recursos que nunca podem ser exauridos, sendo eles inesgotáveis. Ao chegarmos ao Novo Testamento, descobrimos tal plenitude associada à Jesus Cristo.

Vemos tal plenitude descrita na carta aos Colossenses: “Porque aprouve a Deus que, Nele, residisse toda a plenitude” [Cl 1:19]. Se encontramos algum tipo de infertilidade, não é culpa do Senhor, pois Ele não está falido. Aprendemos que da plenitude de Cristo resultou a criação, porque Nele habita toda a plenitude; Ele pode soprar sobre a desordem e trazer um mundo à existência - a plenitude dessa terra é o Senhor. “Toda terra está cheia da Sua glória” (Isaías 6:3), ou “A plenitude da terra é Sua glória”. Nesse Salmo, encontramos plenitude e glória juntas: “Quem é o Rei da glória?”, “Levantai-vos, ó portais eternos, para que entre o Rei da Glória” [Salmo 24: 8;9]. Talvez a razão para nossa infertilidade seja porque não tenhamos percebido que o Rei da Glória precisa estar ali; Senhor dos Exércitos é o Seu nome. Entre a plenitude e o Rei da glória está o homem. Aquele homem alcançou a plenitude e o lugar onde o Rei da Glória entrou. O lugar de onde aquele homem ressuscitou é o lugar da ascensão. Talvez não tenhamos aprendido a chegar ao ponto certo da plenitude. “Quem subirá ao monte do SENHOR? Quem há de permanecer no seu santo lugar?” [vs 3]. No lugar santo havia um candelabro todo de ouro, no qual havia óleo, que era o combustível para produzir luz, e também havia uma mesa de pães, significando suficiência. Nesse lugar ficava também o altar do incenso se elevando e tomando o lugar santo, e é quando chegamos à experiência de permanecer no santo lugar, que a plenitude entra em cena. Quando chegamos ali, o Rei da Glória deve ser manifestado e a plenitude percebida.

Há quatro fatos indicados no Salmo relacionados ao homem que chega ao lugar santo [vs 4]:

(1) Ele é um homem com mãos limpas - o que ele faz é limpo. “Mas todos nós somos como o imundo, e todas as nossas justiças, como trapo da imundícia” [Isaías 64:6]. “Aquele que tocar em algum morto, cadáver de algum homem, imundo será sete dias” (Nm 19:11) - aquilo que está morto pode parecer até belo para nossos corações, mas tocar naquilo que está morto é impuro.

(2) Ele é um homem de coração puro - seus negócios são corretos; ele é um homem que vive em um caminho correto; que tem uma devoção correta. Ele ama a Pessoa certa - e está lá pela devoção à Pessoa, não devido a suas obras ou o que ele fez. Em Apocalipse 2:4 o Senhor diz: “Tenho, porém, contra ti que abandonaste o teu primeiro amor”.

(3) Sua vida é reta - sua alma não tropeça na falsidade (a alma é a pessoa). Ele não se voltou para um caminho lateral, ele é reto para um lado ou para o outro, sua vida é verdadeira, não uma mentira.

(4) “Nem jura dolosamente”- ele é aberto a Deus e não oculta nada. Esse é o homem que permanecerá diante do monte do Senhor, o homem que trará a plenitude e a glória.

Se isso fosse tudo, não poderíamos estar nesse lugar de jeito nenhum, mas no Salmo 24:6 lemos: “Tal é a geração dos que o buscam, dos que buscam a face do Deus de Jacó”. Esse homem, que subirá ao monte do Senhor, é a geração de Jacó, não a geração de Abraão, de Isaque, mas de Jacó. Esse é o homem que vai receber a bênção. Será que as mãos de Jacó eram limpas? Será que seu coração era puro? Será que sua alma era reta? Será que sua vida era aberta? “Deus de Jacó”… Por causa desse detalhe da Palavra, até mesmo nós podemos nos alegrar. Se existiu um homem nas Escrituras que falhou, enganou e que tinha falsidade e engenhosidade engendradas no seu ser, esse homem foi Jacó. Ainda assim: “Tal é a geração dos que o buscam”. Então, podemos olhar para esse salmo e dizer: “Como Jacó chegou a esse lugar, e se Jacó conseguiu, como podemos chegar lá também?” Isso gera um desejo de que possamos chegar ao lugar santo, porque trazer a plenitude e o Homem da Glória estão atrelados a isso.

Existe uma palavra que se destaca para Jacó, e Deus pode fazer qualquer coisa conosco se isso for verdade em nós também: “Tal é a geração dos que o buscam”. Por trás daquela história negra, havia um desejo, um anseio, uma busca pela face de Deus. Jacó era um homem inclinado a estar mais próximo de Deus. Existem muitas pessoas dentre o povo de Deus que não têm nenhuma das características ruins de Jacó, mas exatamente isso lhes falta. Jacó nunca foi indiferente a Deus. No povo de Deus, muitos não tem uma aspiração por Ele. Se o Senhor estiver diante deles, muito bom, mas se houver outra coisa ali, ficarão igualmente satisfeitos.

Algo que Deus amou a respeito de Jacó foi o fato dele ser o homem “certo”. De fato, em Gênesis 25:27, a palavra “pacato” dificilmente pode ser considerada a tradução correta; na tradução da margem [Tradução King James] é dito que ele era um homem perfeito. O homem que estava se inclinando para tais coisas era o homem correto por trás de tudo aquilo; tinha um coração correto, “porque, quanto ao SENHOR, seus olhos passam por toda a terra, para mostrar-se forte para com aqueles cujo coração é totalmente dele [ou perfeito, sincero para com Ele]” [2 Cr 16:9]. Alguns de nós não estão no lugar que Jacó esteve; não existe o desejo por um contato face a face com o Deus Altíssimo. A palavra “buscar” é a mesma usada em Lucas 23:52 - pedir, rogar, e também usada em Atos 16:10 como “procuramos”. Sua busca era em direção a Deus; seu coração estava após Deus, e Deus pôde fazer algo por alguém assim, apesar de ser alguém tão enganoso e torto como Jacó. Jacó sabia perfeitamente bem que, se seu amor por Deus fosse concretizado, ele teria seu direito de primogenitura.

Falando de forma natural, Esaú tinha a primogenitura por estar alguns segundos à frente de Jacó. Moralmente falando, tudo estava contra Jacó para que ele teivesse seu direito de primogenitura. Haviam três coisas envolvidas com o direito de primogenitura.

(1) Pertencia ao primogênito a garantia de uma porção dobrada. “No dia em que fizer herdar a seus filhos aquilo que possuir, não poderá dar a primogenitura ao filho da amada, preferindo-o ao filho da aborrecida, que é o primogênito. Mas ao filho da aborrecida reconhecerá por primogênito, dando-lhe dobrada porção de tudo quanto possuir, porquanto aquele é o primogênito do seu vigor; o direito da primogenitura é dele” (Deuteronômio 21:16,17).

Depois vemos Eliseu e Elias. Elias está prestes a ser tomado para os céus, dizendo: “Pede-me o que queres que eu te faça”, então Eliseu diz: “Peço-te que me toque por herança porção dobrada do teu espírito”, ao que Elias respondeu: “Dura coisa pediste” [2 Rs 2:9,10]. Em Hebreus 12 lemos: “Mas tendes chegado ao monte Sião (este é um grande lugar)… e a incontáveis hostes de anjos, e à universal assembléia (que é um grande grupo) e igreja dos primogênitos arrolados nos céus (que é tudo uma porção dobrada)… e a Jesus, o Mediador da nova aliança” [Hb 12:22-24]. Uma porção dobrada desse espírito. Então, o direito de primogenitura tinha algo que era transferido.

O único meio pelo qual podemos permanecer no santo lugar é com algo da natureza santa.
Havia óleo nos candelabros - nunca veremos a Sua face se estivemos nos movendo em outro plano. Eliseu precisou chegar a Gilgal - o lugar da faca; dali foi para Betel - a Casa de Deus; então partiu para o Jordão - o lugar do enterro; e depois foi para Jericó - onde havia conflito. Poderíamos dizer: “Elias, me dê a porção dobrada”. A não ser que estejamos preparados para o Espírito Santo tornar isso real, nunca o teremos. Se desejamos a porção dobrada, vamos ter que nos desapegar das coisas. Estamos preparados para deixar o Espírito Santo assumir o controle? Acreditamos na soberania do Espírito Santo? Você só terá a porção dobrada ao ver Aquele que ascendeu.

(2) Aquele que tem a porção dobrada tem o direito de governo. Isso nos leva a Efésios 1. Paulo diz: “Por isso, também eu, tendo ouvido a fé que há entre vós no Senhor Jesus e o amor para com todos os santos, não cesso de dar graças por vós, fazendo menção de vós nas minhas orações, para que o Deus de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai da glória, vos conceda espírito de sabedoria e de revelação no pleno conhecimento dele, iluminados os olhos do vosso coração, para saberdes qual é a esperança do seu chamamento, qual a riqueza da glória da sua herança nos santos e qual a suprema grandeza do seu poder… o qual exerceu ele em Cristo, ressuscitando-o dentre os mortos e fazendo-o sentar à sua direita nos lugares celestiais… e para ser o cabeça sobre todas as coisas, o deu à igreja, a qual é o seu corpo, a plenitude daquele que a tudo enche em todas as coisas” (Efésios 1:15-23). Isso se refere ao governo, significa possuir o encabeçamento, significa ser erguido dos lugares de morte para um lugar muito acima de tudo - a plenitude e glória são relacionadas à isso. Mas isso vai custar algo, porque não pode haver plenitude se o corpo está dividido e a igreja despedaçada. Os Cristãos precisam chegar a um lugar sob o Cabeça.

(3) Jacó desejava o direito de primogenitura, porque aquele que o possuía recebia o sacerdócio. “Tendo, pois, a Jesus, o Filho de Deus, como grande sumo sacerdote que penetrou os céus” [Hebreus 4:14]. Jesus está sentado lá, fazendo um poderoso trabalho sacerdotal no trono. O sumo sacerdote poderia contemplar a glória do Senhor e ver o brilho de Seu incomparável esplendor. Isso significa que nós tomamos nosso lugar dentro do santo lugar. Sim, o direito de primogenitura assegurava o sacerdócio. “Vivendo sempre para interceder por eles”. “Também pode salvar totalmente os que por ele se chegam a Deus” [Hebreus 7:25]. Se alguma vez alguém já esteve no extremo, esse alguém foi Jacó, e ainda assim, ele desejava o direito de primogenitura, de forma que pudesse ser um sacerdote para lidar com as pessoas que estavam na mesma condição que dele. Mas Deus diz que você não alcançará seu direito de primogenitura cozinhando lentilhas. A palavra “suplantador” significa “pegar pelo calcanhar”; e esse é o modus operandi satânico: “ferirá no calcanhar” [Gênesis 3:15]. A carne não pode alcançar o direito de primogenitura ou assegurá-lo. Assim, Jacó, você tem que ficar livre da carne.

Estamos ansiando por Deus, e por causa disso desejamos o direito de primogenitura, que vai satisfazer todos os nossos desejos? Bem, você não obterá o direito de primogenitura bajulando a carne; precisa deixá-la morrer. Será que estou preparado para morrer para obter o direito de primogenitura? “Estou crucificado com Cristo; logo, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim; e esse viver que, agora, tenho na carne, vivo pela fé no Filho de Deus, que me amou e a si mesmo se entregou por mim” (Gálatas 2:19,20). Cristo, o primogênito dentre os mortos; Cristo ressurreto, ascenso, Cristo, o sumo sacerdote. Este Cristo está vivo no meu interior, porque estou crucificado. O velho Jacó foi tratado, e agora a porção dobrada está dentro de mim. “Quando Eu ascender aos céus enviarei o Espírito Santo e Ele os guiará”. O Homem que morreu no Calvário lidou com o velho Jacó. O homem que permanecer no santo lugar receberá a bênção. É este homem sacerdotal dentro dele que representa trazer o Rei da Glória.

Estamos fora da porção dobrada - do governo, do sacerdócio? Eles estão aí para nós, mas precisamos ser preparados para recebê-los, não como Jacó, provendo algo para nossa carne, mas por meio de tomar a cruz.


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