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Ministério Espiritual

por T. Austin-Sparks

Capítulo 1 – A Natureza do Ministério Espiritual

Leitura: 2 Cor. 1.

A Segunda Carta aos Coríntios está em grande parte reunida nas palavras do começo do capítulo 4:

“Portanto, visto que temos este ministério…”

Como você sabe, esta carta ocupa-se com a manifestação pessoal de Cristo como sendo a natureza do verdadeiro ministério. Mostra que o ministério é realmente aquilo que é nascido da experiência pessoal, e não só a entrega de verdade estática. O Apóstolo percebeu isto numa nova maneira por causa de uma combinação de elementos que tinham novamente levado ele a um fim de si mesmo. Enquanto você lê estes capítulos você percebe que há, por assim dizer, colunas paralelas. Por um lado estão os sofrimentos, e por outro lado os frutos dos sofrimentos.

Vale a pena tomarmos nota disso por um momento. Começando com o capítulo 1 e tomando somente o lado dos sofrimentos, temos:

Versículo 4: “em toda a nossa tribulação”.
Versículo 5: “os sofrimentos de Cristo transbordam sobre nós”.
Versículo 6: “Se somos atribulados”
Versículo 8: “As tribulações que atravessamos na província da Ásia” “as quais foram muito acima de nossa capacidade de suportar”. “de tal maneira que chegamos a perder a esperança da própria vida” (a palavra “perder” significa literalmente “parecia não haver saída)”.
Versículo 9: “já tínhamos sobre nós a sentença de morte”.
Capítulo 2 versículo 4: “grande aflição e angústia de coração”.
Versículo 13: “não tive plena paz em meu espírito” (lit. nenhum abrandamento).
Capítulo 4 versículo 7: “vasos de barro”.

Depois estão todas estas declarações e palavras que estão tão cheias de significado: “em tudo somos atribulados… perplexos… perseguidos… abatidos… trazendo sempre no corpo o morrer de Jesus”; “Porque nós, que vivemos, somos sempre entregues à morte por causa de Jesus”; “ainda que o nosso homem exterior se esteja consumindo”; “Pois neste tabernáculo nós gememos”. Essa é toda a lista dos sofrimentos.

Agora tornamos para o outro lado, para o fruto dos sofrimentos:
Capítulo 1 versículo 4: “É Ele que nos conforta… para podermos consolar os que estiverem em qualquer angústia”.
Versículo 5: “Assim também por meio de Cristo transborda a nossa consolação”.
Versículo 6: “se somos consolados, para vossa consolação é”.
Versículo 9: “para que confiássemos em Deus, que ressuscita os mortos”. “O qual nos livrou de tão horrível morte”.
Capítulo 4 versículo 7: “a excelência do poder seja de Deus e não de nós” (em oposição ao “vaso de barro”).
Versículo 10: “a vida de Jesus se manifeste em nossos corpos”.
Versículo 16: “nosso homem interior se renova de dia em dia”.
Versículo 17: “cada vez mais abundantemente um eterno peso de glória”.

Desta maneira você tem o paralelo, o equilíbrio, as compensações pelos sofrimentos. Tudo isto está por trás “deste ministério”, e mostra o que a natureza do ministério é. Reforça a declaração feita acima, que o ministério não é uma comunicação de verdade estática. O ministério é aquilo que é nascido da experiência.

Estamos ocupados com o assunto do ministério, ambos ministério pessoal e corporativo; pois o que é verdadeiro do indivíduo que é chamado para este ministério é verdadeiro de qualquer companhia do povo do Senhor como um vaso coletivo. O ministério deles é o resultado da experiência pessoal, e a natureza do ministério é a manifestação pessoal de Cristo nascido da experiência pessoal, e isso principalmente conhecido no sofrimento.

O Caminho do Verdadeiro Ministério Visto em Paulo

Quão intima foi mantida a experiência de Paulo ao seu ensino! Tome a primeira carta aos Coríntios como uma carta de ensino, e então marque como o Apóstolo foi obrigado a basear a experiência no ensino contido nessa carta. Por exemplo, no capítulo 13 Paulo falou da transcendência, poder e vitória do amor Divino. Esse capítulo é uma revelação sem par do amor Divino, e Paulo ressume tudo numa última declaração, “O amor nunca falha”, querendo dizer que o amor sempre prevalece, sai vitorioso, nunca sucumbe no caminho. Agora leia a segunda carta e marque quão grande a demanda desta mesma coisa surge na própria vida de Paulo. Existem muitas referências à oposição, o antagonismo, a hostilidade, o ódio dos cristãos professos em Corinto para com o Apóstolo. De certo, a carta abre com uma referência ao que tinha acontecido lá. Um homem em Corinto tinha tomado uma atitude de aberta e dolorosa hostilidade ao Apóstolo, e a Igreja lá não tinha tomado partido com o Apóstolo em nome da verdade. Paulo escreveu uma carta na qual os envergonhava, e finalmente eles organizaram uma reunião, e por uma maioria de votos decidiram disciplinar este homem. Isso foi o que levou Paulo a escrever como ele fez na abertura desta carta. Ele lhes disse: se vocês perdoaram ele, eu também na presença de Cristo. Consolem ele, para que não seja devorado de demasiada tristeza. Eles o tinham disciplinado, porém toda a assembleia parece ter sido afetada por este homem desde o início, e muitas referências são feitas às coisas que foram ditas em Corinto contra o Apóstolo. Foi dito dele que ele era um homem de sim e não. Alguns de nós poderiam entrar nesse lado de Paulo, e talvez alguns poderiam entrar na experiência dos Coríntios, se permanecemos no mesmo terreno. Paulo tinha dito que ele estava indo ter com eles, e o Senhor não tinha permitido ele ir. Ele tinha dito outra vez que ele estava indo. E novamente ele tinha sido impedido. Assim foi que começou a ser dito, ó, este homem diz uma coisa e nunca a faz; ele faz uma promessa e nunca a cumpre! Você nunca pode ter certeza de que ele cumprirá a sua palavra. Isso é o que é dito quando você permanece em terreno natural. Porém, tome a posição do lado de Paulo. Ele propôs no Senhor fazer algo, e achou no último momento que o Senhor não permitiu ele executá-lo, então ele ficou exposto a muito criticismo. Se as pessoas têm um preconceito contra você, ou estão abertas para ficarem descontentes, eles se lançarão sobre algo assim e o utilizarão contra você.

Haviam outras coisas lá; a carta é um grande desvendar de hostilidade, desgosto, preconceito, mas, ó, que carta do triunfo do amor é esta segunda carta! O amor passou por isso, foi testado por isso; seu amor por eles tem sido posto nos fogos do antagonismo, criticismo e preconceito deles, porém é triunfante. É muito bom escrever o capítulo treze da primeira carta, e dizer, “o amor nunca falha”; é bem outra coisa passar por essa prova de amor numa medida como esta e sair triunfante. O ministério de Paulo tinha que ser mantido lado a lado do seu ensino. “Este ministério” não é uma declaração de verdades gloriosas em palavras; “este ministério” é uma manifestação de Cristo que é nascido do sofrimento.

Ou novamente, tome o capítulo 15 da primeira carta, o grande capítulo sobre a morte e ressurreição. Esse capítulo inteiro é ressumido numa frase e declaração gloriosa: “onde está, ó morte, o teu aguilhão? Onde está, ó morte, a tua vitória?” “Tragada foi a morte na vitória”. Essa é a declaração. Agora com todo o zelo e entusiasmo que brota da consciência da verdade sendo a verdade, você pode proclamar declarações assim. A contemplação de um grande fato pode sacar uma declaração muito enfática. Mas espere um momento: saia para Efésios, e veja o que Paulo tem que enfrentar lá; marque tudo isto que vem sobre ele de Corinto, esta grande angustia do coração, e ouçamos o que Paulo dirá depois disso. “Já em nós mesmos tínhamos a sentença de morte…” tragada foi a morte na vitória, Paulo! “até da vida desesperamos”. Mas, Paulo, você disse que a morte é tragada na vitória! Até da vida desesperamos, parecia que não havia saída, fomos sobremaneira oprimidos acima de nossas forças. Este é o mesmo homem falando, o homem que proclamou que a morte e a sepultura foram vencidas. Fomos sobremaneira oprimidos acima de nossas forças, tínhamos a resposta da morte em nós mesmos. Ah, mas não terminou lá; pois o Apóstolo continua a acrescentar, “para que não confiássemos em nós mesmos, mas em Deus que ressuscita os mortos”. Paulo, em outras palavras, está só dizendo: proclamamos a morte como tragada na vitória, e depois fomos mergulhados nela, e a morte quase nos tragou, mas o que dissemos tem provado ser verdadeiro. “Deus, que ressuscita os mortos”! Ele libertou, Ele liberta, temos depositado nossa esperança Nele, de que Ele ainda nos libertará de tão grande morte.

Você vê como a experiência de Paulo foi mantida em contato com o seu ensino? É uma coisa fazer declarações; é uma outra coisa passar pela experiência, ter essas declarações provadas serem verdade. Isso é o que Paulo quer dizer com “este ministério”.

Isto deve ser de tremendo conforto para nós, e também uma explicação e iluminação. Não deveríamos ficar depressivos quanto a isso. Se o ministério do qual Paulo fala aqui é o ministério para o qual você e eu, e o resto do povo do Senhor é chamado, individualmente e coletivamente, este é o caminho de semelhante ministério. Não existe nenhuma via ideal para o ministério. O ministério não é algo profissional, não é um assunto de um grupo, uma classe. O ministério é nascido daquela angustia e sofrimento em que Cristo é conhecido como Ele não pode ser conhecido de nenhuma outra forma.

No início de sua primeira carta aos Coríntios Paulo disse que Deus escolheu as coisas fracas deste mundo. É como se o Senhor dissesse: Bem, Paulo disse que você deve prová-lo pela experiência; e de uma tão grande morte, com um novo significado, o Apóstolo diz, “temos este tesouro em vasos de frágil barro”. Mas essa consciência de fraqueza, essa concepção do vaso, é uma nova concepção, uma nova consciência desde o tempo em que Paulo fez a declaração na primeira carta.

Temos dito suficiente para mostrar que o verdadeiro ministério brota do descobrimento de Cristo em profundos lugares. Este ministério, que é a manifestação de Cristo, os muitos aspectos de Cristo, os profundos segredos de Cristo, as maravilhas e as glórias de Cristo, a manifestação de Cristo, é nascida de uma experiência necessária na qual Cristo, e Cristo somente, é suficiente. Então você percebe que em tudo isto, e muito mais, o resultado é uma apreensão alargada de Deus em Cristo, a ser manifesta por Ele em todos os crentes.

Cristo o Poder e Sabedoria de Deus no Crente

Temos então nesta segunda carta algumas sugestões e indicações quanto a Cristo como a expressão de Deus no crente, no que respeita à intenção Divina. Digo, sugestões e indicações. Teremos que começar numa nova fase de coisas, porém, se avançarmos na carta veremos que temos toda uma série de sugestões, e ficaremos ocupados com algumas destas mais tarde.
“Porque Deus, que disse: Das trevas brilhará a luz (isso é uma sugestão, uma indicação), é quem brilhou em nossos corações, para iluminação do conhecimento da glória de Deus na face de Cristo”. Então Cristo é a luz de Deus para uma nova criação.

Aqui há outra indicação, e uma outra sugestão. Quando Moisés lia a lei ele punha um véu sobre a sua face por causa da glória que brilhava, para que os filhos de Israel não olhassem firmemente para o fim daquilo que se desvanecia. Existe uma glória insuperável na face de Jesus Cristo, e quando nos voltamos para Ele, não há véu, o véu é retirado. Isto sugere que Cristo é a glória de uma nova aliança.

“Temos, porém, este tesouro em vasos de barro, para que a excelência do poder seja de Deus, e não de nós”. Isto, novamente é uma sugestão e uma indicação. Existe pouca dúvida de que ao escrever dos crentes nesses termos, Paulo tinha em mente o grande exército de Gideão, reduzido a trezentos, a fim de que Israel não se glorie contra mim: para que o poder seja Deus e não deles. Qual é o tesouro? “A luz do conhecimento da glória de Deus na face de Jesus Cristo... em nossos corações”. Quais eram os vasos nas mãos dos trezentos de Gideão? Cântaros vazios, com tochas nelas acesas! Foram o meio de uma grande conquista. Fraqueza contra todo o poder do inimigo! Que grande poder foi. O Espírito Santo não hesita em nos dar a medida do poder dos Midianitas, e dos Amalequitas, e de todos os filhos do Leste. Eles eram como a areia do mar. Trezentos homens triunfaram por meio dos tesouros em vasos de barro. Sugere que Cristo é a energia de um novo tipo de conquista sobre todo o poder do inimigo. A segunda carta aos Coríntios está cheia de indicações, sugestões, intimações quanto ao que Cristo é.

Chegamos até aqui a fim de corroborar o que acabamos de dizer, que para este ministério em maior poder, em maior plenitude, Paulo descobriu Deus em Cristo numa nova maneira através do sofrimento. Todo este sofrimento resultou numa nova apreensão de Deus em Cristo como o poder, e glória, e plenitude do ministério. Isso é ministério. Se aspiramos ao ministério, esse é o ministério do Espírito Santo. É algo mais do que se levantar para pregar, e fazer discursos, para produzir aquilo que nos tem ocupado no estudo. Este tipo de ministério é a manifestação pessoal de Cristo, resultando de uma apreensão Dele em profundos e escuros lugares. Se aspiramos ao verdadeiro ministério, o Espírito Santo velará para que pela experiência nos mantenhamos a par de tudo que dizemos. A verdade se tornará algo entretecido e forjado.

Assim, nesta carta o Apostolo diz, “cremos, por isso falamos”. É apenas outra maneira de dizer, sabemos, por isso testemunhamos. “assim como já alcançamos misericórdia, não desfalecemos…” É um ministério que, a não ser pela misericórdia de Deus, nos mataria. Tendo este ministério, e tendo obtido misericórdia, não desfalecemos. As duas coisas vão juntas. Não é nada pequeno estar realmente no ministério. É algo custoso, mas então está a misericórdia de Deus, e por causa da misericórdia de Deus não desfalecemos. E essa é uma outra indicação, para o exército de Gideão, a Palavra diz, perseguidos… “fatigados, mas ainda perseguindo”. Tendo obtido misericórdia não desfalecemos.

É necessário dizer outra vez que isto não tem a ver com uma classe de pessoas chamados de ministros. Todos nós somos chamados para este ministério. Não é meramente pregar, é uma manifestação pessoal de Cristo. Para isso todos nós somos chamados.

Que o Senhor nos fortaleça para o nosso ministério.

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