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Os Caminhos de Deus

por T. Austin-Sparks

Capítulo 1 – O Caminho da sabedoria

" Vendo a mulher que aquela árvore era boa para se comer, e agradável aos olhos, e árvore desejável para dar entendimento, tomou do seu fruto” (Gen. 3:6).

" O temor do Senhor é o princípio sabedoria; " (Prov. 9:10).

O Caminho da Sabedoria. O Caminho da Salvação

Está muito claro que a primeira tentativa do ser humano de se tornar sábio e de obter sabedoria foi a coisa mais desastrosa e calamitosa. O resultado (e não tenho dúvida de que Adão agiu como juiz de si mesmo em relação a esta questão) foi que ele procedeu loucamente; quando buscou tornar-se sábio, tornou-se louco. Foi algo desastroso, que contrariou o próprio significado e essência da sabedoria, pois, a função e o valor da sabedoria é o de nos salvar de erros desastrosos. Isto é algo muito simples que repousa na superfície das coisas. Se algumas vezes cometemos erros graves, podemos culpar a nossa falta de sabedoria. Assim, sabedoria é algo que se destina a nos salvar e a nos prevenir de erros e de calamidades resultantes de tais erros, para que o sábio não precise dizer “Cometi um terrível erro, e agora, como resultado, não resta outra coisa senão problema, calamidade e tragédia”. O sábio não precisa olhar para trás com arrependimentos. Assim, se pudéssemos encontrar o caminho da sabedoria, encontraríamos o caminho da salvação, do livramento, da luz, um caminho que jamais irá nos trazer qualquer tipo de arrependimento, mas sim real satisfação. No final poderemos dizer: “Graças a Deus tomei este caminho”. Isto é sabedoria em sua própria essência, portanto, o tipo de sabedoria que Adão obteve não era a verdadeira sabedoria, e, como dissemos, apenas contrariava o próprio significado e essência dela.

O Caminho da Sabedoria - Um Longo Caminho

Mas, embora isso seja verdadeiro, o caminho da sabedoria é um longo caminho; isto é, a verdadeira sabedoria normalmente é revelada através de uma longa caminhada. Nem sempre conseguimos enxergar o passo sábio sendo justificado imediatamente. Normalmente a sabedoria é justificada ao longo do tempo; somente bem lá adiante na estrada é que a sabedoria que escolhemos para nos guiar provará ser realmente a sabedoria do alto, pois ela irá esperar até o fim para que seja justificada. Somente lá no final é que iremos reconhecer de fato quão sábia era a sabedoria que nos guiou e de quantas coisas ela nos livrou. Nem sempre conseguiremos dizer no início da caminhada 'Estou feliz por ter dado este passo, por ter tomado este caminho’. É somente à medida que avançamos que começamos a enxergar que a sabedoria está conosco, e ela certamente estará.

A Inescrutabilidade da Sabedoria Divina

E por ser assim desta maneira, vemos a nós mesmos diante de algo que, para a nossa mente mundana, para o mundo e para os padrões mundanos, é totalmente imcompreensível e inescrutável, pois, trata-se de sabedoria Divina. Dificilmente poderia ser considerada sabedoria Divina se logo de início já pudéssemos entendê-la, se pudéssemos trazê-la imediatamente para dentro da nossa própria esfera de compreensão. A sabedoria Divina é algo incompreensível, inescrutável para este mundo. Por ainda haver muito deste mundo em nossas análises, somos grandemente influenciados por suas considerações nas grandes questões e decisões.

Sabedoria Divina é uma questão de fé. Precisamos de fé para nos conformarmos a ela. Todas essas coisas que acabamos de mencionar estão envolvidas no caso de Adão, nosso primeiro grande exemplo. Adão não estava preparado para esperar; ele queria receber tudo de uma vez; queria conhecer tudo imediatamente e ter sabedoria em si mesmo. É por isso que o caminho da sabedoria é tolice aos olhos deste mundo, pois não consegue compreendê-la. A sabedoria é loucura aos olhos do homem natural.

Essas são as coisas com as quais você e eu nos deparamos na vida prática, e isso de vária maneiras. Se você está no mundo, isso é algo que realmente lhe incomoda – o que o mundo considera sabedoria e o que considera loucura. Se haverá uma rápida realização e justificação da escolha que você tomou, do caminho que você escolheu, ou se você terá que esperar, parecendo estar tendo uma perda. Você irá se aquietar e fechar os seus ouvidos aos argumentos das pessoas ao seu redor, as quais lhe dirão para fazer coisas contrárias às que você faria por pertencer ao Senhor? Bem, essas são questões práticas do dia a dia para as pessoas deste mundo, especialmente para homens e mulheres mais jovens. Mas, a verdade é que você se depara o tempo todo com as seguintes questões: com a questão da política e da diplomacia, o que o mundo chama de bom senso. Toda esta questão de Sr. Sábio segundo o mundo ocorre conosco em muitas questões de ordem espiritual. Essas questões estão sempre presentes.

O Resultado da Sabedoria

O que é sabedoria? O que é loucura? Há dois padrões distintos de julgamento acerca disso. Um é terreno e outro, celestial, e esses dois padrões jamais se misturam. Que seja bem enfatizado, o que realmente importa é se, ao longo do caminho, seremos capazes de dizer: "Cometi um engano que comprometeu toda a minha vida; fiz a coisa errada; tropecei e gerei complicações; arrependo-me por ter tomado este caminho, pois isso atrapalhou em muito a minha vida!" Esta é a conclusão obtida ao longo do caminho e ela conta mais do que qualquer outra coisa. Este é o resultado da sabedoria.

A Sabedoria do Primeiro Adão

Esta questão da sabedoria está associada a dois homens. Um é o primeiro Adão, o qual, ao tentar ser sábio por si mesmo, tornou-se um tolo e cometeu um erro que não apenas prejudicou a si próprio, mas que acabou colocando toda a raça humana em séria dificuldade. E o que poderia ser escrito de toda essa história de Adão é: "Fiz papel de tolo; cometi o mais terrível engano; compliquei tudo por não ter escolhido a verdadeira sabedoria".

A Sabedoria do Último Adão

O outro homem, aquele que corporifica a verdadeira sabedoria, é o Último Adão. O que poderíamos dizer se tivéssemos que resumir a sua história? Diríamos: "Você escolheu o caminho certo; fez a coisa certa; tomou a sábia decisão; não há qualquer dúvida quanto à Sabedoria do seu caminho". Cada um de nós em Cristo certamente somos uma vindicação dele, e de sua sabedoria em suas decisões e escolhas. Não é natural para o nosso coração dizer que Jesus estava certo! Certamente não estaríamos aqui se não fosse por convencimento, e tudo está ligado a esta questão da sabedoria.

O Princípio da Sabedoria

A palavra aqui diz, em discurso direto, e de aplicação e implicação quanto ao que lemos em Gênesis 3:6 - "O temor do Senhor é o princípio da sabedoria”, ou, literalmente, a primeira parte da sabedoria. É aí onde a sabedoria começa. Agora, embora a palavra ‘temor’ possa sugerir o elemento medo, esta, porém, não é toda a verdade. O temor aqui mencionado é algo nascido do amor e não do medo ou do terror. Na verdade, pode haver muito temor em afeição e respeito. Este amor, esta afeição, não está livre de certa dose de temor, para que a pessoa possa de alguma maneira se sentir contristada, ferida, machucada, ou tenha algum motivo para se sentir desconfiada. É temor de todo modo. Este é o tipo de temor que temos aqui. É aquele tipo de temor que uma criança sente por seus pais amados, ao invés daquele terrível medo que alguém sente por um tirano.

Em primeiro lugar, o temor do Senhor reside no fato de a mente de Deus ser revelada, de sermos colocados numa posição em que a vontade de Deus nos é mostrada. Você percebe claramente a diferença entre o primeiro e o último Adão. Deus havia revelado a sua vontade ao primeiro Adão; mas este jamais disse: 'Conhecemos a vontade de Deus a respeito disto; sabemos o que Deus pensa acerca disto; não podemos alegar ignorância; estamos totalmente informados quanto à Sua posição; conhecemos a Sua vontade.' O primeiro Adão jamais falou dessa maneira. Porém, o último Adão disse: 'Está escrito... Está escrito... Está escrito..." (Mat. 4:1-10). "Deus disse; Deus revelou a Sua vontade", e o temor do Senhor reside nisso. Agora, o que você irá fazer a respeito? Na relação com o Senhor, este tipo de temor, o temor da afeição, assume a posição do filho e do Pai. O Senhor Jesus disse o seguinte: "Meu Pai não me deixou qualquer dúvida acerca da Sua vontade, e isso é o que importa". Nós não podemos alegar ignorância quanto à mente de Deus em geral, e, em certa medida, no particular; ela está revelada a nós. E o conhecimento da mente do Senhor está disponível a nós, para que a sabedoria, que é o temor do Senhor, seja expressada através de uma completa e fundamental consagração ao Senhor.

Completa Consagração ao Senhor

É aí onde o Senhor Jesus estava. Ele tinha uma fundamental consagração ao Pai e à vontade do Pai. Era algo que o dominava desde a infância: "Os negócios do meu Pai" (Lucas 2:49); "A casa do meu Pai"; "A vontade do meu Pai". Era algo fundamental. É algo que precisa estar bem estabelecido como fundamento, em relação a se optaremos pelo Senhor ou por outra coisa qualquer; ou, se optaremos pelo Senhor e por mais alguma outra coisa; ou, se optaremos apenas pelo Senhor, sabendo que apenas Ele possui total conhecimento dos nossos corações. Precisamos de total consagração; não pode haver coração dividido!

Uma notável ilustração de coração dividido no Velho Testamento é Saul. Quando o Senhor mandou Samuel dizer a Saul: “Fere a Amaleque e destrói tudo o que ele tiver, e não o poupes." (1 Sam. 15:3) Saul utilizou o seu próprio julgamento em detrimento à vontade do Senhor. Ele disse, "Temi ao povo" (1 Sam. 15:24), e não, "Temi ao Senhor." Você lembra das terríveis palavras de Samuel: "Eis que o obedecer é melhor do que o sacrificar; e o atender melhor é do que a gordura de carneiros... Porquanto tu rejeitaste a palavra do Senhor, Ele também te rejeitou a ti, para que não sejas rei... O Senhor rasgou hoje de ti o reino de Israel e o deu a outro melhor do que tu." (1 Sam. 15:22-24,28). Saul foi o homem que usou essas palavras que empregamos aqui uma ou duas vezes: "Procedi loucamente" (1 Sam. 26:21). Ele tinha um coração dividido. De um lado, havia certa devoção ao Senhor, quem sabe até bem-intencionada, porém, muito fraca, não forte o suficiente. Saul se preocupou com a sua imagem perante um outro povo, como ele iria ser visto por eles, e pensou que pena abrir mão disto, sacrificar aquilo, ao invés de dizer: “Bem, é assim que a coisa aparenta ser para mim, e sei que terei problemas com as pessoas, e haverá consequências, porém, o Senhor me mostrou ser esta a Sua vontade e isso é o que importa".

A Prova da Consagração

Lembre-se de que, à semelhança de Adão, Saul, Judas (o qual é o exemplo mais notável do Novo Testamento), nós sempre seremos colocados à prova, mas não sem que nos seja dada uma oportunidade. O Senhor não nos obriga a seguir o Seu caminho, deixando-nos sem opção ou alternativa. O tempo todo Ele nos permite fazer escolhas, para que possamos tomar outro caminho, um caminho mais fácil; Ele nos permite até mesmo julgarmos a Sua vontade pronunciada. Ele deu a Adão uma oportunidade e uma advertência. Saul também teve a sua oportunidade com uma possível alternativa. Há a oportunidade, e esta é a prova quanto ao temor do Senhor, nossa total consagração, a totalidade do nosso coração ao Senhor.

A Última Vindicação da Verdadeira Sabedoria

Mas esta sabedoria é eventual e eternamente vindicada. Sempre, embora seja através da fé, da paciência, e do sofrimento. Este tipo de sabedoria é algo muito estranho para este mundo, o qual diz aos seguidores de Cristo: “Olha aqui, meus jovens, vocês são loucos; estão prejudicando todas as suas expectativas, tomando um caminho que não os levará a lugar algum. Se fossem sábios, fariam isto ou aquilo, o que lhes protegeria a reputação, posição e outras coisas mais.' Geralmente o caminho da sabedoria celestial é o caminho que nos leva para o deserto do nosso Senhor, fazendo-nos rejeitar os reinos deste mundo, com seus aplausos e aclamações. Significa Cruz, sofrimento, perda de todas as coisas, reprovação dos homens e ostracismo de irmãos, pois, como está escrito, ‘até mesmo os seus irmãos não criam nele’. (João 7:5). Esses eram seus próprios irmãos de sangue. E por que não criam nele? Provavelmente porque eram homens ambiciosos. Haviam crescido na pobreza, na adversidade e na dificuldade, e, para eles, o caminho de um reino terreno, de um grande e popular Messias, pesava mais do que o caminho escolhido por esse desprezado irmão deles, que o tempo todo fazia coisas que o colocava contra os poderes que havia na terra, comprometendo tanto o futuro dele como o de seus irmãos. Mas eles passaram a crer nele mais tarde, graças a Deus. (Tiago, o irmão do Senhor, e também os demais irmãos, vieram a crer nele). Porém, por aquele tempo presente, até que por meio da paciência e do sofrimento Ele fosse vindicado, o caminho era de perda, e normalmente esta é a própria natureza e essência do temor do Senhor. Estaria o Senhor indicando que assim também será o nosso caminho? Que assim será o curso da nossa vida? Um caminho custoso, de sofrimento, um caminho que, para as demais pessoas, governadas pelos padrões deste mundo, é de completa loucura? Um caminho de desvantagem? Não estou sugerindo que você seja um tolo; que desnecessariamente busque o prejuízo. Você sabe do que estou falando. É do terreno espiritual. Este é o caminho; caminho de absoluta loucura aos olhos do mundo.

Você irá escolhê-lo? Você sabe o que disse o sábio escritor de Provérbios a respeito da sabedoria: "Emprega tudo o que possuis e adquire entendimento" (Prov. 4:7); a sabedoria “é mais preciosa do que rubis" (Prov. 3:15); "A sabedoria já edificou a sua casa; já lavrou as suas sete colunas" (Prov. 9:1). O temor do Senhor é o princípio da sabedoria; é uma total consagração a Ele; é nunca se corromper; nunca transigir; é não ter coração dividido. É difícil, custoso, doloroso, amargo à vida da alma. Isso pode ser aplicado a todos os tipos de questões e crises. Tudo deve se basear no seguinte: não no “Como isso irá me afetar?” Não no “o que eu vou perder ou ganhar”, mas sim, no “Onde está o Senhor nisto? Ficará Ele satisfeito? Como irá Ele obter aquilo que deseja?” Ou, se não consigo ver nada que traga um bom resultado, minha atitude deve ser: não tenho a menor dúvida de que, se eu seguir pelo caminho do Senhor, a coisa será desta maneira; não vejo outra maneira que corresponda àquilo que conheço do Senhor; isso resolverá toda a questão, fazendo cessar o conflito. Vou seguir com o Senhor, não importa o que possa custar. "Meu alvo é o próprio Deus, e não obter alegria, paz ou mesmo bênçãos” – sem subornos; apenas o próprio Deus. Isto é fundamental. Esta deve ser a base do nosso amor, da nossa devoção ao Senhor: o nosso senso daquilo que devemos a Ele; do quanto Ele significa para nós. Em qualquer outra base, o nosso relacionamento com Ele será difícil, frio e legalista. Que o Senhor possa nos encontrar nesta posição onde o amamos e guardamos os Seus mandamentos por este único motivo.

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