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Portões de Pérola

por T. Austin-Sparks

Editado e suprido por Golden Candlestick Trust. Origem: "Gates of Pearl". (Traduzido por Maria P. Ewald)

“As doze portas são doze pérolas, e cada uma dessas portas, de uma só pérola.” (Ap 21:21)

“As nações andarão mediante a sua luz, e os reis da terra lhe trazem a sua glória.” (Ap 21:24)

“Então, me mostrou o rio da água da vida, brilhante como cristal, que sai do trono de Deus e do Cordeiro. No meio da sua praça, de uma e outra margem do rio, está a árvore da vida, que produz doze frutos, dando o seu fruto de mês em mês, e as folhas da árvore são para a cura dos povos.” (Ap 22:1,2)

Sem me delongar nos detalhes de interpretação, estou assumindo que essa cidade santa, a Nova Jeruslaém, descendo do céu da parte de Deus (Ap 21:2) tipifica a igreja glorificada, e que essa igreja que está aqui representada é constituída por princípios espirituais, e, ainda, que esses princípios são a ocupação do Espírito de Deus na edificação dessa igreja espiritualmente agora nessa dispensação.

As entradas e saídas pelos Portões

Tendo dito isso, vamos olhar para essas características simbólicas que personificam os princípios espirituais da igreja, que vão aparecer em seu pleno significado eventualmente na glória. Aqui nesses versículos lidos, temos portões, pérolas, nações, reis e vemos que as entradas e saídas são através desses portões; das nações para a cidade temos os portões, onde temos as forças da vida – vida e saúde para as nações. Por meio dos portões, um ministério visível de vida é levado em frente. Por meio desses portões os reis trazem suas glórias. Isso é, certamente, uma figura do grande ministério que a igreja é chamada a cumprir. O povo de Deus em sua eterna vocação: como um caminho ou um meio, como um vaso derramando vida para as nações. Eles se tornam algo que as nações reconhecem como sendo um instrumento formado e preparado para sua bênção. Então, eles devolvem o reconhecimento mostrando que é por meio da igreja que eles podem receber o bem da vida, graça e plenitude. Acredito que, de forma curta, é isso que está aí em princípio, e eu gostaria de falar um pouco mais sobre isso.

Através do que é representado pelos portões de pérola, vemos que as nações são vistas obtendo vida, saúde e plenitude dessa igreja constituída pelo Espírito Santo em princípios divinos. Falaremos sobre isso daqui a pouco. Através desses portões, os reis das nações trazem sua glória, seus tributos, sua própria glória, as riqueza que receberam por meio da igreja, e que agora devolvem em forma de tributo e reconhecimento. Eles se voltam e, com efeito, dizem: “Chegamos a isso por sua causa. Reconhecemos esse fato e pagamos um tributo em agradecimento; colocamos nossa glória sobre a graça de Deus que foi tão grandemente manifestada em vocês”. Assim como disse o apóstolo, a igreja se torna, portanto, para “louvor da glória da Sua graça” (Ef 1:6). “A Ele a glória (das nações) na igreja e em Cristo Jesus em todas as gerações para todo o sempre (Ef 3:21). O que será devido à igreja!

Os Portões – o Lugar de Governo

Isso nos leva, é claro, aos portões, os quais são nosso objetivo central no momento. Como sabemos, no Antigo Testamento, os portões de qualquer cidade eram o lugar de governo. Era ali, nos portões, que o governo era estabelecido. Ali as regras eram conhecidas. Era lá que a vida deveria ser alinhada com os pensamentos daqueles que estavam estabelecidos como autoridade. Os portões eram sempre símbolos de governo. Existe um fator governamental atrelado a esses portões de pérola.

O Fator Governante – Comunhão com Cristo nos Seus Sofrimentos

A sabedoria divina escolhe a pérola como símbolo daquilo que é o caminho para a bênção e o caminho da glória. Esse símbolo implica que o grande fator governante é nossa comunhão com os sofrimentos do nosso Senhor. A pérola é a personificação da angústia, sofrimento, sangue e lágrimas. Não preciso me alongar para descrever a formação da tão valiosa pérola. É pela angústia do organismo, quando dá sua própria vida e sangue para essa maravilhosa formação. O Senhor é apto para escolher esse símbolo de governo que é a própria essência do ministério. Governo com Deus não é algo oficial, algo autocrático, despótico, um domínio. Governo com Deus é: se você, na minha mais profunda necessidade e aflição, puder ser uma bênção para mim, você se tornará verdadeiramente um fator governamental na minha vida. Me curvo e me rendo. Na profundeza da minha aflição não encontro ajuda em outro lugar, e Deus me concede ajuda através de você. Deus colocou você em um lugar de grande poder e autoridade sobre a minha vida. Você se tornou um elemento real. Isso é governo com Deus.

Esse é o princípio do governo do Senhor Jesus. Ele sustenta Seu lugar, não em virtude de uma posição despótica oficial. Ele sustenta Seu lugar como Senhor em virtude da Sua Cruz e angústia, em virtude de ter sido capaz de suprir cada necessidade de nossas vidas, quando elas não poderiam ser supridas em nenhum outro meio desassociado Dele. Isso O torna Senhor. Podemos nos curvar diante Dele por isso. É por isso que no livro de Apocalipse tudo vem do Cordeiro que foi morto. Ele está no Trono, Ele está em posição de supremo poder, não porque Deus o colocou ali em uma capacidade oficial, mas porque através do Cordeiro, toda a necessidade é suprida. Tudo em nós está pronto para se curvar diante do Cordeiro, pelo ministério que nos supriu através de Seu sofrimento.

Esse é o princípio, o princípio divino de ministério. O único caminho para o fluir da vida, da cura, da plenitude espiritual é o caminho do sofrimento e agonia. É na comunhão com os Seus sofrimentos que a igreja vai cumprir o seu ministério plena e verdadeiramente.

O que é verdade para a igreja como um todo, é claro, é verdadeiro para cada parte dela. Em um organismo assim, se “um membro sofre, todos os membros sofrem com ele (1 Co 12:26). De alguma forma estranha e misteriosa isso é verdade, cada parte é batizada nos sofrimentos de Cristo.

Surge então a questão: Se nossas vidas devem ser caminhos para a plenitude de Deus, caminhos para o fluir da vida e cura, caminhos para o Senhor, devemos ter unidade com esse princípio da pérola. Haverá sangue, lágrimas e sofrimentos. Tudo isso se resume no que o Senhor quiz dizer em Suas palavras: “Porquanto, quem quiser salvar a sua vida perdê-la-á; e quem perder a vida por minha causa achá-la-á.” (Mt 16:25). “Devemos dar nossa vida pelos irmãos” (1 Jo 3:16). Dar nossas almas. Eu sei que “vida” e “alma” são palavras intercambiáveis derivadas da mesma palavra original. Eu escolho “almas” porque é muito comum, quando falamos de entregar nossa vida, as pessoas pensarem que é ser um mártir de alguma forma, sendo espancado até a morte ou queimado vivo. Não, dar sua vida – isso é algo diário, deve acontecer ao longo de toda vida, deixando de lado nossos interesses pessoais, nossas ambições, sofrendo na esfera dos ardentes e terríveis desapontamentos desta vida. Isso significa abandonar o que pode se erguer contra nosso relacionamento com o Senhor, aquilo que poderia ser ou seria, se não estivéssemos seguindo o Cordeiro para onde quer que Ele fosse [Ap 14:4]. Esse é o caminho do sacrifício. Como poderíamos escapar disso se não estivéssemos seguindo o Cordeiro! – reprovação, sacrifício, disciplina.

Aqueles que se tornarão um meio para que o Senhor derrame Sua verdadeira plenitude para os círculos mais amplos de Seu interesse, aqueles que por meio Dele e Sua graça receberão esse tributo dos reis da terra (linguagem simbólica de novo), ao ouvirem deles: “Devemos isso a você que está em Deus, que nos proporcionou chegar a esse benefício e essa riqueza”. Aqueles que estarão nessa posição – e isso não é algo místico, mas é bem real e está bem claro para nós – são aqueles que conhecerão a disciplina sob a mão de Deus de forma que ninguém mais conhece. Se você for chamado para um ponto mais próximo ao Senhor, não pense que isso significa que tudo serão bênçãos e gratificações de acordo com seus desejos. De jeito nenhum! O Senhor vai lidar com você mais severamente do que com qualquer outro.

Gordon, em um dos livros de sua série “Conversa tranquila”, ao falar que o Senhor não permitiu que Moisés entrasse na terra, utiliza a figura das gerações posteriores. Pequenas crianças sentandas no colo de seus pais e mães, ouvindo a história de Moisés, que, depois de toda a sua vida de sofrimento e sacrifício, foi no final proibido por Deus de continuar em frente. Eles diriam: “Oh, isso foi cruel da parte de Deus, não foi gentil”, e o pai poderia dizer (da forma como Gordon colocou), “Ah, mas veja, Moisés não foi um homem comum, e homens como Moisés não podem fazer coisas comuns; todo mundo está olhando para Moisés e todos tem que ver que a desobediência não será tolerada, ainda que seja um homem representativo como Moisés”. Sim, o Senhor lida severamente com alguns de nós porque não somos pessoas comuns – posso assim dizer? – não somos pessoas comuns. A igreja não é uma coisa comum. Existe muita coisa atrelada com a igreja e todas as suas partes, e o Senhor deve ser muito exigente. Devemos ser levados aos sofrimentos que outras pessoas desconhecem, a fim de conhecer esse ministério, e para que a grande e eterna vocação possa ser cumprida. O fluir do Senhor como o rio de águas da vida, as nações trazendo a glória para Ele, através da igreja. Esse é o caminho da pérola.

Se você está tentando evitar, se esquivando de reprovações, perseguições e todo esse tipo de coisa, você pode estar sacrificando seu próprio ministério, pode estar cortando e represnado completamente o próprio rio de água da vida. Você pode estar privando a si mesmo e o Senhor de muita glória, simplesmente por estar escondendo a sua luz, uma vez que deixá-la brilhar iria te trazer reprovação, sofrimento, perseguição, ostracismo, etc. Mas, atenção! Não vale a pena.

Eu digo a você, caro amigo, a mão do Senhor pode estar sobre você por meio de caminhos estranhos. Ele dá e então parece tomar de você. Ele, por um milagre te dá Isaque, e então Ele diz: “me ofereça”. Caminhos estranhos, aparentes contradições do Senhor, caminhos misteriosos. Que sofrimento, perplexidade, mas que glória! Esse é o caminho de um ministério que não é comum, nada superficial. São reis que trazem sua glória à cidade, pessoas que contam, que chegaram a valores reais e e então dizem: “Foi através de você e porque você estava preparado para seguir o caminho mais difícil, porque estava preparado para conhecer o sofrimento do Senhor; foi por meio dos seus sofrimentos na graça de Deus que me tornei o que sou”. Reis trarão seu tributo e nações receberão vida.

Vemos o princípio perfeitamente claro, e apesar de ser possível alargá-lo, e ainda há muito aqui, a palavra é essa: o caminho do alargamento, da glória, é o caminho do sofrimento, pelo qual, apesar de pensarmos representar um corte, um impedimento, estreitamento, privação, portas fechadas...nesse momento, Deus tem Sua maneira maravilhosa de trazer alargamento espiritual, ainda que seja dessa forma. Pode parecer que é algo pequeno, inferior – oh não, não necessariamente. Isso depende do seu ponto de vista, se é do homem ou de Deus, se é da terra ou do céu, as idéias de grandeza do céu são muito diferentes das idéias da terra. Tenha certeza que se você está conhecendo a comunhão dos Seus sofrimentos, qualquer que seja, você vai conhecer a comunhão com esse grande ministério de vida, plenitude, saúde e glória.


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